REVIEW: A COMPANHIA NEGRA
- ALASTOR
- 18 de set. de 2015
- 3 min de leitura
De vez em quando eu começo a ler um livro ou uma série de livros que não estejam mais na memória dos demais, (que estejam fora do foco da "moda literária") mas que realmente deveriam ter ficado. Esta série de Glen Cook é um bom exemplo. Mas nas palavras de Steven Erikson: "Glen Cook, sozinho, mudou a cara de fantasia".

A Companhia Negra é o primeiro livro da série de mesmo nome, publicado pela primeira vez em 1984, este livro foi responsável por levar o gênero de fantasia a uma transformação, com sua introdução de personagens realistas e seu completo desrespeito pela fantasiosa, estereotipada, e aparentemente eterna, batalha de valores, pra não usar o clichê do "bem contra o mal".
E de fato se trata de um livro brilhante, contando a história da Companhia Negra, último dos bastiões livres de Khatovar, a última das Doze verdadeiras Companhias que existiram. Parte disso nos é transmitido pelo médico da Companhia e historiador Chagas, vivendo num mundo devastado pela guerra civil, mas que ainda caminha, ao seu modo, rumo à uma última esperança. Chagas é levado constantemente às profundezas das dobras da Companhia, que abrange desde a honra, que detêm próximo ao seu ímpeto mesmo sendo raro, até a força que a torna inabalável.
No geral, se trata de uma força de elite de mercenários que tem um passado heróico, mas no momento conta apenas com homens desafortunados, sendo assim dificilmente pode se dar ao luxo de escolher os seus empregadores. Nesta tentativa de reviver o passado de glórias, a Companhia Negra se une ao exército da Dama, uma feiticeira de poder inigualável que acordou de um sono de eras para reconquistar tudo que perdeu. A Companhia se vê envolvida, então, em muito mais do que campanhas militares: ela precisa sobreviver aos conflitos extremamente traiçoeiros entre os servos da Dama. Num mundo onde a magia está presente em cada esquina, toda rua esconde segredos maravilhosos... e perigos mortais.
Os membros da Companhia são arrastados para dentro de um conflito, sem ao menos saberem de qual lado eles estão, fazendo com que o próprio leitor não entenda bem esse contexto e se perca em meio a isso, pois as trevas espreitam, principalmente de dentro de cada membro da Companhia.
O primeiro capítulo estabelece o vazio moral no núcleo de decisões da Companhia, pois trair a sua primeira entidade patronal a favor de uma segunda, mais potente e para ser melhor remunerado. Mas até o final do primeiro capítulo, torna-se aparente que a Companhia assinou um contrato com alguém muito pior do que qualquer empregador na memória recente dos seus relatos. Glen imediatamente atrai-nos para um mundo repleto de ação com uma temática de morte livre, ao contrário de tantos livros, onde a contagem de morte milagrosamente parece inexistente. Sendo uma história que nos prende, mas que está repleto de humor negro, sendo contada a partir da perspectiva de primeira pessoa de Chagas.
O mundo em que a narrativa de Glen nos ambienta é de fantasia-medieval e a primeira impressão que temos é a não-existência dos estereótipos de fantasia que habitualmente estamos acostumados. As páginas da literatura de fantasia estão completamente fora de seus planos. Tolkien ou Eddings não estão presentes, pelo menos em princípio, mas se você está ciente do trabalho de Steven Erikson, então não irá se surpreender ao saber que Glen influenciou bastante Erikson.
Tendendo para uma narrativa mais a maneira de Bernard Cornwell não há uma disputa entre "o bem e o mal" acontecendo aqui, e isso é fácil de notar, pois as trevas são muito latentes, e logo a rápida ação narrativa nos mostra algo muito realista onde todas as duras realidades da vida militar são postas cruamente. Perde-se a bravata de alguns autores que se utilizam de personagens capazes de resistir a qualquer coisa e ignorar tudo. Personagens são perdidos no início deste livro, e as reações a essas perdas são de fazer ruir qualquer convicção, no melhor estilo George R. R. Martin nas Crônicas de Fogo e Gelo.
Não há mais característica fundamental desta obra do que as personagens puramente reais que são encontrados na obra, todos contêm fragilidades e falhas que são encontrados em qualquer ser humano. Este livro é muito amoral e não contém caracteres bidimensionais. Como já mencionado, o Companhia Negra é um livro maravilhosamente próximo do real, muitas vezes obscuro e contendo violentas batalhas entre personagens fantásticos. Glen Cook mudou a cara do gênero da fantasia para sempre - e para melhor.
Eu estava absolutamente fascinado por essa história, com seu realismo corajoso e forma narrativa rápida. Junto com a perspectiva de que a história é contada, como uma análise de registro da história da própria Companhia, o que é realmente inteligente. Você tem a sensação de que você está realmente lendo os relatos de Chagas.
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